sábado, 6 de dezembro de 2014

O Papagaio Real - Câmara Cascudo

Bordado por: Neuza Oli Vieira
nemabh25@yahoo.com.br
55 31 3337-7026
Desenho: Demóstenes Vargas


Há muitos anos atrás, numa pequena cidade de um país bem longe viviam duas irmãs. Eram muito diferentes uma da outra. A mais nova era uma jovem de bons sentimentos, alegre e feliz com a sua vida. Mas a mais velha era uma inveja só.

A irmã mais velha vivia espreitando a outra. Certa noite ouviu um barulho diferente vindo do quarto da irmã. Pé ante pé colou seu ouvido na porta do quarto da irmã e não satisfeita  olhou através da fechadura. O que viu foi estranho, pois no meio do quarto havia uma grande bacia com água. E logo em seguida uma surpresa: um grande papagaio que voando rápido passou pela janela e entrou no quarto em direção à bacia. Banhou-se e bem devagar foi- se transformando em um lindo jovem. Os dois jovens então começaram a conversar e ali ficaram por um longo tempo.

A irmã invejosa ficou enfurecida. Um príncipe se encantando pela tonta da irmã? E logo pensou em um plano. Passou o dia seguinte atarefada juntando cacos de vidro. Colocou-os no peitoril da janela e dentro da bacia sem que a irmã percebesse. E aguardou a noite chegar!

Não demorou nada e o papagaio chegou. Já no peitoril sentiu suas patas arderem. Pensando em se aliviar na água da bacia acabou cortando-se ainda mais. A jovem sem entender o que estava acontecendo ficou aterrorizada. Nesta noite o papagaio não se transformou em príncipe. Com dificuldade voou até a janela e lhe disse:
-         Ah, ingrata! Porque tanta maldade? Esta seria a última noite do meu encanto, depois nunca mais voltaria a ser um papagaio. Agora vai demorar a ter fim este meu sofrer. Para me ver novamente só se for ao Reino de Acelóis.

E dizendo isto bateu asas e sumiu no horizonte deixando a jovem atônita e desesperada. Ela viu que aquela armadilha só poderia ter sido feita pela irmã. No mesmo instante sentiu que era hora de partir. Saiu pelo  mundo à procura de seu amado. Mas, onde seria aquele Reino de Acelois? Andou por muitos lugares, sempre perguntando onde ficava o Reino de Acelóis. Ninguém sabia!

Uma tardinha, já muito cansada de andar e perguntar a todos pelo Reino de Acelóis viu que a noite chegava e ela não tinha onde pernoitar. Subiu numa grande arvore do caminho e ficou protegida pelas folhas. Já bem tarde da noite ouviu sons estranhos. Eram animais de aspectos amedrontadores que ela nunca havia visto.
-     E você de onde vem?
-         Eu? De longe! Do Reino da Lua!
-         E você?
-         Venho do Reino do Sol! E assim a conversa  se prolongou noite à dentro.

No dia seguinte pegou a estrada novamente. Nunca deixava de perguntar sobre o reino e o castelo do jovem príncipe.  Acostumou-se a subir nas arvores para fugir dos animais ferozes e também para poder dormir tranquila. E o tempo passou. E um dia, estando protegida em outra arvore de flores grandes e galhos protetores, ouviu outra conversa daqueles andarilhos estranhos:
-         E você? De onde vem?
-         Eu? Venho do Reino da Estrela!
-         E você?
-         Eu? Venho do Reino de Acelóis e trago novidades! O príncipe de Acelóis está muito doente, pobre coitado!

A jovem prestou bem atenção na conversa e ficou quietinha no alto da arvore.  Antes do sol nascer já estava pronta para pegar o caminho. Agora sabia que Acelois estava mais perto.  Mas o dia passou e ela não conseguiu nenhuma informação. De noitinha parou e buscou outra grande arvore e subiu para passar a noite. E ouviu novamente outra conversa.
-         E você de onde vem?
-         Eu venho do Reino de Acelóis.
-         E como vai o príncipe?
-         Vai mal, muito mal. Acho que seu caso não tem remédio!
-         Ora, tem jeito sim. O remédio é o príncipe beber três gotas de sangue do dedo mindinho de uma jovem que o ame ardentemente. Pena que eu esteja atrasado em minha caminhada. Senão... voltaria lá para informar sobre este remédio.

A jovem não acreditou no que ouvia. Assim que o dia começou a raiar ela desceu da arvore e pegou a estrada. Pouco tempo depois já se encontrava no Reino de Acelóis. Chegou ao grande palácio. Lá procurou pelo Rei e ofereceu seus préstimos para salvar o jovem príncipe. Mas ela tinha uma condição, pois sabia que o rei não acreditaria em seus sentimentos e também por ser uma jovem pobre.  Seu preço? Metade do Reino escrito em documento real. O Rei relutou, mas queria salvar seu único filho.

Assinados os papéis a jovem se dirigiu aos aposentos reais. Furou seu dedo, colheu três pingos de seu sangue, colocando-os em um copo com água. Fez o príncipe beber. Foi só beber e sentiu-se melhor. Em poucos minutos já estava conversando e assentado em seu leito. Reconheceu a jovem e abraçou-a ternamente. O Rei ficou radiante de alegria, mas quando o príncipe lhe disse querer casar com aquela jovem, dona de seu coração desde os tempos de sua vida de papagaio, o Rei não deu o seu consentimento.

Mas como a jovem era firme e decidida já foi logo dizendo ao Rei:
-         Majestade! Agora eu sou uma moça rica! Tenho metade deste reino e aqui está o documento! Como não posso me casar com o príncipe? A não ser que o senhor queira dividi-lo ao meio. Eu levo então uma metade!
O Rei ao ouvir aquelas palavras viu que a jovem não era de brincadeira. Era decidida e firme em seus propósitos. Finalmente consentiu no casamento. As bodas foram preparadas e durante três dias e três noites houve festa no reino de Acelóis para todos os amigos. Tinha comes e bebes a fartar e muitos músicos. Foi um lindo casamento.

Estive lá. Trouxe uma cestinha para vocês de deliciosos frutos silvestres recheados de doce de leite de cabra, pequenas codornas feitas no leite, geleias de amoras silvestres misturadas com mel de abelhas negras do Reino de Acelóis. Vim com cuidado pois as estradas são estreitas e os riachos muitas vezes transbordam à época das cheias. Mas... um imprevisto. Na última pinguela uma tábua se soltou, escorreguei e não consegui segurar a cestinha que, caindo na água, correu riacho abaixo...


Resumo feito por Neuza Vieira de Oliveira do conto recontado por Luis da Câmara Cascudo  - Contos tradicionais do Brasil 

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