segunda-feira, 8 de novembro de 2010

A Bela Adormecida




Era uma vez, há muito tempo, um rei e uma rainha jovens, poderosos e ricos, mas pouco felizes, porque não tinham concretizado o maior sonho deles: terem filhos.
— Se pudéssemos ter um filho! — suspirava o rei.
— E se Deus quisesse, que nascesse uma menina! —animava-se a rainha.
Não se alegravam nem com os bailes da corte, nem com as caçadas, nem com os gracejos dos bufões, e em todo o castelo reinava uma grande melancolia.
Numa tarde de verão, a rainha foi banhar-se no riacho que passava no fundo do parque real. E, de repente, pulou para fora da água uma rãzinha.
— Majestade, não fique triste, o seu desejo se realizará logo: antes que passe um ano a senhora dará à luz uma menina.
A profecia da rã se concretizou e, meses depois, a rainha deu a luz a uma linda menina. O rei, feliz, deu uma grande festa de batizado para a pequena princesa, que se chamava Aurora.
Convidou uma multidão de súditos: parentes, amigos, nobres do reino e, como convidadas de honra, as treze fadas que viviam nos confins do reino. Mas, quando os mensageiros iam saindo com os convites, o camareiro-mor correu até o rei, preocupadíssimo.
— Majestade, as fadas são treze, e nós só temos doze pratos de ouro. O que faremos? A fada que tiver de comer no prato de prata, como os outros convidados, poderá se ofender. E uma fada ofendida…
O rei refletiu longamente e decidiu:
— Não convidaremos a décima terceira fada — disse, resoluto.
— Talvez nem saiba que nasceu a nossa filha e que daremos uma festa. Assim, não teremos complicações.
Partiram somente doze mensageiros, com convites para doze fadas, conforme o rei resolvera.No dia da festa, cada uma das fadas chegou perto do berço em que dormia a princesa Aurora e ofereceu à recém-nascida um presente maravilhoso.
— Será a mais bela moça do reino — disse a primeira fada, debruçando-se sobre o berço.
— E a de caráter mais justo — acrescentou a segunda.
— Terá riquezas a perder de vista — proclamou a terceira.
— Ninguém terá o coração mais caridoso que o seu — afirmou a quarta.
— A sua inteligência brilhará como um sol — comentou a quinta.
Onze fadas já tinham passado em frente ao berço e dado a pequena princesa um dom; faltava somente uma (entretida em tirar uma mancha do vestido, no qual um garçom desajeitado tinha virado uma taça de sorvete) quando chegou a décima terceira, aquela que não tinha sido convidada por falta de pratos de ouro.
Estava com a expressão muito sombria e ameaçadora, terrivelmente ofendida por ter sido excluída. Lançou um olhar maldoso para a princesa Aurora, que dormia tranqüila, e disse:
— Aos quinze anos a princesa vai se ferir com o fuso de uma roca e morrerá.
E foi embora, deixando um silêncio desanimador e os pais desesperados.
Então aproximou-se a décima segunda fada, que devia ainda oferecer seu presente.
— Não posso cancelar a maldição que agora atingiu a princesa. Tenho poderes só para modificá-la um pouco. Por isso, Aurora não morrerá; dormirá por cem anos, até a chegada de um príncipe que a acordará com um beijo.
Passados os primeiros momentos de espanto e temor, o rei decidiu tomar providências; mandou queimar todas as rocas do reino. E, daquele dia em diante, ninguém mais fiava, nem linho, nem algodão, nem lã.
Aurora crescia, e os presentes das fadas, apesar da maldição, estavam dando resultados. Era bonita, boa, gentil e caridosa, os súditos a adoravam.
No dia em que completou quinze anos, o rei e a rainha estavam ausentes, ocupados numa partida de caça. Talvez, quem sabe, em todo esse tempo tivessem até esquecido a profecia da fada malvada.
A princesa Aurora, porém, estava se aborrecendo por estar sozinha e começou a andar pelas salas do castelo. Chegando perto de um portãozinho de ferro que dava acesso à parte de cima de uma velha torre, abriu-o, subiu a longa escada e chegou, enfim, a um quartinho.
Ao lado da janela estava uma velhinha de cabelos brancos, fiando com o fuso uma meada de linho. A garota olhou, maravilhada. Nunca tinha visto um fuso.
— Bom dia, vovozinha.
— Bom dia a você, linda garota.
— O que está fazendo? Que instrumento é esse?
Sem levantar os olhos do seu trabalho, a velhinha respondeu com ar bonachão:
— Não está vendo? Estou fiando!
A princesa, fascinada, olhava o fuso que girava entre os dedos da velhinha.
— Parece mesmo divertido esse estranho pedaço de madeira que gira assim rápido. Posso experimentá-lo também?
Sem esperar resposta, pegou o fuso. E, naquele instante, cumpriu-se o feitiço. Aurora furou o dedo e sentiu um grande sono. Deu tempo apenas para deitar-se na cama que havia no aposento, e seus olhos se fecharam.
Na mesma hora, aquele sono estranho se difundiu por todo o palácio.
Adormeceram no trono o rei e a rainha, recém-chegados da partida de caça.
Adormeceram os cavalos na estrebaria, as galinhas no galinheiro, os cães no pátio e os pássaros no telhado.
Adormeceu o cozinheiro que assava a carne e o servente que lavava as louças; adormeceram os cavaleiros com as espadas na mão e as damas que enrolavam seus cabelos.
Também o fogo que ardia nos braseiros e nas lareiras parou de queimar, parou também o vento que assobiava na floresta. Nada e ninguém se mexia no palácio, mergulhado em profundo silêncio.
Em volta do castelo surgiu rapidamente uma extensa mata. Tão extensa que, após alguns anos, o castelo ficou oculto.
Nem os muros apareciam, nem a ponte levadiça, nem as torres, nem a bandeira hasteada que pendia na torre mais alta.
Nas aldeias vizinhas, passava de pai para filho a história da princesa Aurora, a bela adormecida que descansava, protegida pelo bosque cerrado. A princesa Aurora, a mais bela, a mais doce das princesas, injustamente castigada por um destino cruel.
Alguns cavalheiros, mais audaciosos, tentaram sem êxito chegar ao castelo. A grande barreira de mato e espinheiros, cerrada e impenetrável, parecia animada por vontade própria: os galhos avançavam para cima dos coitados que tentavam passar: seguravam-nos, arranhavam-nos até fazê-los sangrar, e fechavam as mínimas frestas.
Aqueles que tinham sorte conseguiam escapar, voltando em condições lastimáveis, machucados e sangrando. Outros, mais teimosos, sacrificavam a própria vida.
Um dia, chegou nas redondezas um jovem príncipe, bonito e corajoso. Soube pelo bisavô a história da bela adormecida que, desde muitos anos, tantos jovens procuravam em vão alcançar.
— Quero tentar também — disse o príncipe aos habitantes de uma aldeia pouco distante do castelo.
Aconselharam-no a não ir.
— Ninguém nunca conseguiu!
— Outros jovens, fortes e corajosos como você, falharam…
— Alguns morreram entre os espinheiros…
— Desista!
Muitos foram, os que tentarem desanimá-lo.
No dia em que o príncipe decidiu satisfazer a sua vontade se completavam justamente os cem anos da predição da fada. Chegara, finalmente, o dia em que a bela adormecida poderia despertar. Quando o príncipe se encaminhou para o castelo viu que, no lugar das árvores e galhos cheios de espinhos, se estendiam aos milhares, bem espessas, enormes carreiras de flores perfumadas. E mais, aquela mata de flores cheirosas se abriu diante dele, como para encorajá-lo a prosseguir; e voltou a se fechar logo, após sua passagem.
O príncipe chegou em frente ao castelo. A ponte levadiça estava abaixada e dois guardas dormiam ao lado do portão, apoiados nas armas. No pátio havia um grande número de cães, alguns deitados no chão, outros encostados nos cantos; os cavalos que ocupavam as estrebarias dormiam em pé.
Nas grandes salas do castelo reinava um silêncio tão profundo que o príncipe ouvia sua própria respiração, um pouco ofegante, ressoando naquela quietude. A cada passo do príncipe se levantavam nuvens de poeira.
Salões, escadarias, corredores, cozinha… Por toda parte, o mesmo espetáculo: gente que dormia nas mais estranhas posições.
O príncipe perambulou por longo tempo no castelo. Enfim, achou o portãozinho de ferro que levava à torre, subiu a escada e chegou ao quartinho em que dormia a princesa Aurora.
A princesa estava tão bela, com os cabelos soltos espalhados nos travesseiros, o rosto rosado e risonho que o príncipe ficou deslumbrado. Inclinou-se e deu-lhe um beijo.
Imediatamente, Aurora despertou, olhou para o príncipe e sorriu.
Todo o reino também despertara naquele instante.
Acordou também o cozinheiro que assava a carne; o servente, bocejando, continuou lavando as louças, enquanto as damas da corte voltavam a enrolar seus cabelos.
O fogo das lareiras e dos braseiros subiu alto pelas chaminés, e o vento fazia murmurar as folhas das árvores. A vida voltara ao normal. Logo, o rei e a rainha correram à procura da filha e, ao encontrá-la, chorando, agradeceram ao príncipe por tê-la despertado do longo sono de cem anos.
O príncipe, então, pediu a mão da linda princesa em casamento que, por sua vez, já estava apaixonada pelo seu valente salvador.
Eles, então, se casaram e viveram felizes para sempre!
Autor: Irmãos Grimm


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