O Soldadinho de Chumbo
Andersen
Ao lado do pelotão de chumbo se erguia um lindo
castelo de papelão, um bosque de árvores verdinhas e, em frente, havia um
pequeno lago feito de um pedaço de espelho.
A maior beleza, porém, era uma jovem que vestia uma saia de tule rosa bem franzida e uma blusa bem ajustada. Seu lindo rostinho era emoldurado por longos cabelos presos por uma tiara enfeitada com uma pequenina pedra azul. Era uma bailarina, por isso mantinha o braço erguido sobre a cabeça e uma perna no ar. O soldadinho a olhou longamente e logo se apaixonou, pensando que, tal como ele, aquela jovem tivesse uma perna só.
A maior beleza, porém, era uma jovem que vestia uma saia de tule rosa bem franzida e uma blusa bem ajustada. Seu lindo rostinho era emoldurado por longos cabelos presos por uma tiara enfeitada com uma pequenina pedra azul. Era uma bailarina, por isso mantinha o braço erguido sobre a cabeça e uma perna no ar. O soldadinho a olhou longamente e logo se apaixonou, pensando que, tal como ele, aquela jovem tivesse uma perna só.
À noite, antes de deitar, o menino guardou os
soldadinhos na caixa, mas esqueceu daquele de uma perna só caído atrás de uma
caixa. Quando os ponteiros do relógio marcaram meia-noite, todos os brinquedos
se animaram e começaram a aprontar uma enorme bagunça! Mas o soldadinho de uma
perna só não conseguia parar de olhar para a bailarina.
Então se ergueu da caixa um homenzinho muito
mal-encarado. Era um gênio ruim, que só vivia pensando em maldades. Assim que
ele apareceu, todos os brinquedos pararam amedrontados. O gêniozinho olhou à
sua volta e viu o soldadinho, deitado atrás da cigarreira.
— Ei, você aí, por que não está na caixa, com seus
irmãos? — gritou o monstrinho. — Amanhã vou dar um jeito em você, você vai ver!
Na manhã seguinte, o menino arrumou todos os
soldadinhos perto da janela. O perneta, como de costume, era o último da fila.
De repente, a veneziana se abriu, bateu um vento forte. Teria sido o gêniozinho
maldoso? O pobre soldadinho voou pela janela enquanto caía um verdadeiro
temporal. Quando o céu limpou, chegaram dois moleques. Eles se divertiam,
pisando com os pés descalços nas poças de água. Um deles viu o soldadinho de
chumbo e exclamou:
— Olhe! Um soldadinho! Será que alguém jogou fora
porque ele está quebrado?
— É, está um pouco amassado. Deve ter vindo com a enxurrada.
— Sabe de uma coisa? Vamos colocá-lo num barco e mandá-lo dar a volta ao mundo.
— É, está um pouco amassado. Deve ter vindo com a enxurrada.
— Sabe de uma coisa? Vamos colocá-lo num barco e mandá-lo dar a volta ao mundo.
Construíram um barquinho com uma folha de jornal,
colocaram o soldadinho dentro dele e soltaram o barco para navegar na água que
corria pela sarjeta. Apoiado em sua única perna, o soldadinho de chumbo
procurava manter o equilíbrio. O barquinho dava saltos e esbarrões na água
lamacenta, acompanhado pelos olhares dos dois moleques que, entusiasmados com a
nova brincadeira, corriam pela calçada ao lado.
Lá pelas tantas, o barquinho foi jogado para dentro de
um bueiro e continuou seu caminho, em uma imensa escuridão. De repente apareceu
um enorme rato de esgoto, com olhos fosforescente e um horrível rabo fino e
comprido. Com o coração batendo fortemente, o soldadinho voltava todos seus
pensamentos para a bailarina, que talvez nunca mais pudesse ver. Mas o
barquinho continuou seu caminho, arrastado pela correnteza. Enfim, o soldadinho
viu ao longe uma luz, e respirou aliviado. A água do esgoto chegara a um rio
com um grande salto, as ondas agitadas viraram o frágil barquinho de papel e o
soldadinho de chumbo afundou.
Mal tinha chegado ao fundo, apareceu um enorme peixe
que, abrindo a boca, engoliu-o.
O soldadinho se viu novamente numa imensa escuridão, espremido no estômago do peixe. E não deixava de pensar em sua amada: “O que estará fazendo agora minha linda bailarina? Será que ainda se lembra de mim?” Passou-se muito tempo — quem poderia dizer quanto? E, de repente, a escuridão desapareceu.
O soldadinho se viu novamente numa imensa escuridão, espremido no estômago do peixe. E não deixava de pensar em sua amada: “O que estará fazendo agora minha linda bailarina? Será que ainda se lembra de mim?” Passou-se muito tempo — quem poderia dizer quanto? E, de repente, a escuridão desapareceu.
Sabem o que tinha acontecido? O peixe havia sido
fisgado por um pescador, levado ao mercado e vendido a uma cozinheira. E, por
um cúmulo de coincidência, não era qualquer cozinheira, mas sim a que
trabalhava na casa do menino que ganhara o soldadinho no aniversário! Ao limpar
o peixe, a cozinheira encontrara dentro dele o soldadinho, do qual se lembrava
muito bem, por causa daquela única perna. Lavou-o com água e sabão e o levou
para o garotinho, que fez a maior festa ao revê-lo. Limpinho e lustroso, o
soldadinho foi colocado sobre a mesma mesa em que estava antes. Nada estava
mudado: o castelo de papel, o pequeno bosque de árvores muito verdes, o lago
reluzente feito de espelho. E, na porta do castelo, lá estava ela, a bailarina,
mais bela do que nunca.
O soldadinho olhou para a bailarina, ainda mais
apaixonado, ela olhou para ele. Ele desejava conversar, mas não ousava.
Sentia-se feliz apenas por estar novamente perto dela. Se pudesse, ele contaria
toda sua aventura; com certeza a linda bailarina iria apreciar sua coragem.
Quem sabe, até se casaria com ele… De repente — é caso de se pensar se o
gêniozinho ruim não metera seu nariz outra vez —, o soldadinho de chumbo voou
para a lareira, onde o fogo ardia intensamente. O pobre soldadinho sentiu um
forte calor. A sua única perna estava amolecendo, as belas cores do uniforme, o
vermelho escarlate da túnica e o azul da calça perdiam suas tonalidades. O
soldadinho lançou um último olhar para a bailarina, que retribuiu com silêncio
e tristeza. Ele sentiu então que seu coração de chumbo começava a derreter.
Naquele momento, a porta escancarou-se com violência, e uma rajada de vento fez
a bailarina voar diretamente para a lareira, bem junto ao soldadinho. Bastou
uma labareda e ela desapareceu. O soldadinho também se dissolveu completamente.
No dia seguinte, a arrumadeira, ao limpar a lareira,
encontrou no meio das cinzas um pequenino coração de chumbo: era tudo que
restara do soldadinho, fiel até o último instante ao seu grande amor. Da
pequena bailarina só restou a minúscula pedra azul da tiara, que antes brilhava
em seus longos cabelos.
Nenhum comentário:
Postar um comentário